por Igor Miguel
WHAT
HAPPENED WITH JESUS’ HAFTARAH?
(O QUE ACONTECEU COM A HAFTARÁ DE
JESUS?)
Foi recentemente publicado um artigo pelo Jornal
israelense Haaretz, que trata de um assunto polêmico, mas que precisa ser
debatido. Muitos estudiosos e pesquisadores das Escrituras, em específico
aqueles que se especializaram sobre o Novo Testamento, vinham questionando algo
interessante.
Alguns sabem que há uma tradição milenar no
judaísmo, que é a leitura de porções dos profetas após a leitura pública da Torá
(Pentateuco). Estes textos previamente selecionados dos escritos
proféticos são chamados de Haftará. Uma das fontes mais antigas, que
descreve ocasionalmente esta tradição judaica, está maravilhosamente preservada
em um texto do chamado Novo Testamento, em específico em Lucas 4:16-20 que diz:
“Indo [Yeshua/Jesus] para Nazaré, onde
fora criado, entrou, num sábado [Shabat], na sinagoga, segundo o seu costume, e levantou-se para ler.
Então lhe deram o rolo do profeta Isaías, e abrindo o livro, achou o lugar onde
estava escrito: O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para
evangelizar os pobres [...] tendo fechado o rolo, devolveu-o ao assistente
[chazan] e sentou-se ...” .
Este texto fascinante, demonstra com clareza que
Yeshua (Jesus) fez a leitura pública do rolo do profeta Isaías na sinagoga em
um Shabat. O que fazia Ele na ocasião? Nada mais, nada menos, que a
antiga e boa tradição judaica da leitura da Haftará, já mencionada.
Porém, o problema que alguns estudiosos observaram
ao ler esta narrativa, foi: Que trecho é este que Yeshua leu? Ora o
texto lido por Ele advém em específico do capítulo 61:1 e 2 do livro do profetaIsaías. Daí surgiu outra
questão: Se a leitura das porções dos profetas (a Haftará) é selecionada
antecipadamente, em uma tabela oficial. Quando esta leitura é ou era feita
na sinagoga? Esta dúvida permaneceu durante muito tempo sem uma resposta
satisfatória.
Sabe-se que a leitura oficial dos profetas é
determinada por uma escala elaborada pela tradição dos rabinos. Assim vem
sendo orientada por centenas de anos. Mas, o que se percebe no caso de
Yeshua, é que o texto lido por ele, não se encontra na escala de leituras do
judaísmo atual. Por quê? Há algum erro no Novo Testamento? Há os
que sustentam este argumento, porém, esta não é a resposta adequada. Teria
então, a lista de leitura das Haftarôt (plural de Hafatará) sofrido alguma
alteração, por parte de alguns rabinos ou decretos rabínicos?
Foi publicado pelo jornal israelense já mencionado,
um artigo intitulado em inglês como: “What happened to Jesus’ Haftarah?” de
autoria de Hananel Mack1, cuja informação é no mínimo intrigante. Produto
sem dúvida de uma mente crítica e atenta a possíveis falhas na bela estrutura do judaísmo, imprecisões que
precisam ser criticadas e discutidas, ao invés de serem friamente aceitas.
O que o autor do artigo propõe, é que existem raras
referências na tradição judaica, que podem dar alguma pista de quando
exatamente surgiu a prática da leitura dos profetas nas sinagogas. Há
obviamente os que argumentam que esta nasceu no período dos Macabeus (166-63
A.E.C.), porém o autor deixará claro que estas evidências históricas ainda são
questionáveis. O curioso é que ele recorrera a fontes, inusitadas para o
judaísmo, que provam a existência desta prática já na época do II Templo. Incrivelmente
um dos documentos, demonstrado pelo autor, que descreve a leitura da Haftará no
I século E.C., está no chamado Novo Testamento. Um trecho é o que narra a
leitura pública do profeta Isaías por Yeshua (Jesus) na sinagoga de Nazaré e outro
é o que está preservado no livro de Atos dos Apóstolos capítulo 13. Estas
são claras evidências de que tal prática era comum na época do II Templo, tanto
em Israel como na Galút (diáspora).
O quê autor questiona é que, como já fora
introduzido, não há menção deste trecho do profeta Isaías (lido por Yeshua) na
lista oficial de leituras da Haftará do judaísmo recente. Logo, vem a
pergunta: O que aconteceu então, com a Haftará que Jesus leu na sinagoga de
Nazaré?
EXCLUSÃO DELIBERADA DE TEXTOS
MESSIÂNICOS
Para o autor israelense houve uma exclusão
deliberada por parte de líderes religiosos judeus da diáspora, principalmente
em redutos judeus onde havia uma cultura predominantemente cristã. Para ele
houve uma iniciativa da elite religiosa judaica em REMOVER os textos
em que YESHUA poderia ser identificado ou associado ao Messias.
A curiosidade é que os capítulos 60, o final do
61, o capítulo 62 e 63 do profeta Isaías, estão na lista de leitura da Haftará. Mas,
estranhamente, o início do capítulo 61, que fora lido por Yeshua em Nazaré, não
está na lista. Segundo o autor, na verdade o texto lido por Yeshua fora
excluído arbitrariamente.
Esta inferência apresentada por Mack não foi
produzida sem fundamentos. Baseia-se na antiga lista de leitura de Haftarôt encontrada na Guenizá2 da
sinagoga do Cairo. De fato, o referido texto (Isaías 61:1 e seg.) era lido
na Haftará desta antiga comunidade do Norte da África. Por quê? Porque
as comunidades judaicas desta região, não tinham contato com os debates sobre
Yeshua (Jesus) e o judaísmo, afinal eram locais onde havia predominância
religiosa islâmica. Não havia conflito entre a cultura local e
a estrutura litúrgico-teológica do judaísmo nestes locais. Não havia
nada, a priori, no Islã que poderia por em risco a fé judaica.
Em suma, o que o autor tenta demonstrar é que houve
um esforço no judaísmo ocidental (que logo se espalhou para o restante do mundo
judaico) de excluir textos que eram tradicionalmente usados por cristãos como
textos prova a respeito de uma possível “messianidade” de Yeshua. Estes
eram os chamados textos messiânicos.
Todos os textos abaixo foram excluídos deliberadamente da tradição
judaica, por motivos óbvios. O interessante é que a leitura atual da Haftará
engloba ou versos ou capítulos, antes ou depois destes trechos, mostrando
claramente a resistência do judaísmo em inserir em sua liturgia textos
messiânicos.
ALGUNS TEXTOS EXCLUÍDOS PELA TRADIÇÃO
JUDAICA DA LEITURA DAS HAFTARÔT:
ISAÍAS 7:14 - “Portanto, o Senhor mesmo vos
dará um sinal: eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho e lhe chamará
Emanuel”.
ISAÍAS 52:13 e 14 - “Eis que o meu Servo procederá com prudência; será
exaltado e elevado e será mui sublime. Como pasmaram muitos à vista dele (pois
o seu aspecto estava mui desfigurado, mais do que o de outro qualquer, e a sua
aparência, mais do que a dos outros filhos dos homens)”.
ISAÍAS 53:1-6 - “Quem creu em nossa pregação? E
a quem foi revelado o braço do SENHOR? Porque foi subindo como renovo perante
ele e como raiz de uma terra seca; não tinha aparência nem formosura;
olhamo-lo, mas nenhuma beleza havia que nos agradasse. Era desprezado e o
mais rejeitado entre os homens; homem de dores e que sabe o que é padecer; e,
como um de quem os homens escondem o rosto, era desprezado, e dele não fizemos
caso. Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas
dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus e
oprimido. Mas ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas
nossas iniquidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós
andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo caminho, mas o
SENHOR fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos”.
ISAÍAS 42:1-7 - [Mateus 12:17] “Eis aqui o meu
servo, a quem sustenho; o meu escolhido, em quem a minha alma se compraz;
pus sobre ele o meu Espírito, e ele promulgará o direito para os gentios. Não
clamará, nem gritará, nem fará ouvir a sua voz na praça. Não esmagará a cana
quebrada, nem apagará a torcida que fumega; em verdade, promulgará o direito.
Não desanimará, nem se quebrará até que ponha na terra o direito; e as terras
do mar aguardarão a sua doutrina. Assim diz Deus, o SENHOR, que criou os
céus e os estendeu, formou a terra e a tudo quanto produz; que dá fôlego de
vida ao povo que nela está e o espírito aos que andam nela. Eu, o SENHOR, te
chamei em justiça, tomar-te-ei pela mão, e te guardarei, e te farei mediador da
aliança com o povo e luz para os gentios; para abrires os olhos aos cegos,
para tirares da prisão o cativo e do cárcere, os que jazem em trevas”.
JEREMIAS 31:31-33: “Eis aí vêm dias, diz o
SENHOR, em que firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá.
Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão,
para os tirar da terra do Egito; porquanto eles anularam a minha aliança, não obstante eu os haver
desposado, diz o SENHOR. Porque esta é a aliança que firmarei com a casa
de Israel, depois daqueles dias, diz o SENHOR: Na mente, lhes imprimirei as
minhas leis, também no coração lhas inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles
serão o meu povo”.
OSÉIAS 11:1 - “Quando Israel era menino, eu o amei;
e do Egito chamei o meu filho”.
MIQUÉIAS 5:2 – “E tu, Belém-Efrata, pequena demais
para figurar como grupo de milhares de Judá, de ti me sairá o que há de reinar
em Israel, e cujas origens são desde os tempos antigos, desde os dias da
eternidade”.
ZACARIAS 9:9 – “Alegra-te muito, ó filha de Sião;
exulta, ó filha de Jerusalém: eis aí te vem o teu Rei, justo e alvador, humilde, montado em jumento, num
jumentinho, cria de jumenta”.
Parece meio óbvio, que estes textos tenham sido
excluídos da leitura pública da tradição judaica, fica evidenciado que estas
profecias têm profundas implicações de ordem messianológica, em favor de Yeshua
como única pessoa histórica que se tem relato textual que cumpriu, ou pelo
menos teve algum vínculo com estas profecias. O que se vê é um esforço
deliberado contra a figura de Yeshua (Jesus) como Messias.
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2Guenizá Æ Um compartimento específico
em sinagogas, para abrigar livros danificados, ou documentos que não estão em
perfeito estado de conservação. Na tradição judaica, livros sagrados, mesmo em
condições questionáveis, não podem ser lançados fora. Estes documentos
permanecem em compartimentos específicos sem tempo determinado, neste caso, esta
lista “diferente” de Haftarôt, fora encontrada na Guenizá de uma sinagoga do
Cairo (Egito).
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